“A foto de um grande E$<#070. Do lado de casa tem essa
praça. José de Alencar. Uma homenagem a um grande E$<#070. Escravista. E sua
estátua me lembra todos os dias como não só
apagamos a memória da escravidão, mas cultuamos o escravismo.”
Alguém
publicou no Facebook estes dias... muitos comentários tão agressivos quanto o
texto publicado corroboravam o autor do post, todos prometendo boicotar o
autor à partir daquele instante. Muitos que talvez gostassem dos livros de
Alencar, deixaram de apreciar sua obra à luz desta “nova” informação. Mas uma
mente mais serena comentou “Nunca mais lerei seus textos da mesma forma”. Esta
pessoa não postou que nunca mais lerá José de Alencar, só comenta que sua
perspectiva sobre ele mudou. No frenesi do momento as pessoas acabam não percebendo que o seu comportamento é o mesmo daquele que diz “não
leio as obras do Fulano porque ele é de direita ou esquerda”.
Isso tudo
levantou uma questão em minha cabeça: até que ponto o posicionamento político,
sexual, social, etç do autor influencia na minha experiência com a obra
publicada? Não deveríamos nós todos estar abertos ao diálogo e ouvir o
posicionamento daqueles que pensam diferente de nós? Será que se o autor do
post ao invés de criticar José de Alencar estivesse criticando a parada gay
teria tantos comentários de apoio?
Claro que falar sobre escravidão não tem nada á se comparar
com os tópicos acima levantados por minha vã filosofia, mas quando se critica
alguém, principalmente do passado, devemos ter o cuidado para evitar
anacronismos. Deve-se levar em questão o fato de que a escravidão, que hoje é
vista como algo perturbador, desumano e cruel, naquela época era tida como algo
normal e inclusive apoiada por setores tradicionais da sociedade como
políticos, escritores e até alguns membros da igreja (vide a luta do frade
Bartolomé de Las Casas no século XVI para reverter este quadro). Então, José de
Alencar, em sua posição como político que era, visando o bem dos grupos à que
defendia se posicionava desta maneira, e acredito que grande parte dos jovens
revoltados daquele post de Facebook, se vivessem no século XIX e portanto desprovidos
do esclarecimento sobre o assunto à que chegamos hoje, estariam lhe apoiando
também.
Em que momento em Iracema José de Alencar apoiou a
escravidão? Ou em que página no infelizmente inacabado O Sertanejo ele apoia a
crueldade para com o outro? As pessoas de hoje são totalmente contra o preconceito
e defendem esta bandeira com unhas e dentes, mas infelizmente por causa da
cegueira causada pela ignorância, não percebem que assim o fazem com diferentes
assuntos.
Tenho diversos exemplos de artistas, escritores, pensadores
e professores dos quais antagonizo com suas pessoas, mas admiro e respeito o
seu trabalho, o próprio José de Alencar é um destes exemplos, pois não
concordo com esse posicionamento específico de sua vida pública, mas quanto à
suas obras, não posso menosprezar absolutamente nada.
Isto me lembra de outro
episódio recente onde o escritor Paulo Coelho se posicionava contra a
deselegância cometida por nosso Presidente Jair Messias Bolsonaro com a esposa
do Presidente Francês Emmanuel Macron e dentre os comentários de apoio ao presidente
brasileiro encontro um monumental “escritorzinho lixo”.
Enquanto isso, o monumento que levantou esta questão está lá
naquela praça muito mais pela obra de José de Alencar do que pela sua “luta” à favor da escravidão. Caso o objetivo fosse venerar esse sistema econômico arcaico e
cruel (como pretendia argumentar o publicador do post), tenho certeza que outras
opções seriam consideradas.
Mas caso a intenção deste filósofo de Facebook
fosse atacar monumentos polêmicos de nossas praças brasileiras, acredito que haveriam
alternativas mais frugívoras, como por exemplo o monumento aos bandeirantes em
São Paulo.
Ah, mas é claro eu esqueci da terceira e mais provável opção: o
atual “mimimi”.