quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Um grande "Fi%$0 d! Put%"


“A foto de um grande E$<#070. Do lado de casa tem essa praça. José de Alencar. Uma homenagem a um grande E$<#070. Escravista. E sua estátua me lembra todos os dias como não só apagamos a memória da escravidão, mas cultuamos o escravismo. 

Alguém publicou no Facebook estes dias... muitos comentários tão agressivos quanto o texto publicado corroboravam o autor do post, todos prometendo boicotar o autor à partir daquele instante. Muitos que talvez gostassem dos livros de Alencar, deixaram de apreciar sua obra à luz desta “nova” informação. Mas uma mente mais serena comentou “Nunca mais lerei seus textos da mesma forma”. Esta pessoa não postou que nunca mais lerá José de Alencar, só comenta que sua perspectiva sobre ele mudou. No frenesi do momento as pessoas acabam não percebendo que o seu comportamento é o mesmo daquele que diz “não leio as obras do Fulano porque ele é de direita ou esquerda”

Isso tudo levantou uma questão em minha cabeça: até que ponto o posicionamento político, sexual, social, etç do autor influencia na minha experiência com a obra publicada? Não deveríamos nós todos estar abertos ao diálogo e ouvir o posicionamento daqueles que pensam diferente de nós? Será que se o autor do post ao invés de criticar José de Alencar estivesse criticando a parada gay teria tantos comentários de apoio?

Claro que falar sobre escravidão não tem nada á se comparar com os tópicos acima levantados por minha vã filosofia, mas quando se critica alguém, principalmente do passado, devemos ter o cuidado para evitar anacronismos. Deve-se levar em questão o fato de que a escravidão, que hoje é vista como algo perturbador, desumano e cruel, naquela época era tida como algo normal e inclusive apoiada por setores tradicionais da sociedade como políticos, escritores e até alguns membros da igreja (vide a luta do frade Bartolomé de Las Casas no século XVI para reverter este quadro). Então, José de Alencar, em sua posição como político que era, visando o bem dos grupos à que defendia se posicionava desta maneira, e acredito que grande parte dos jovens revoltados daquele post de Facebook, se vivessem no século XIX e portanto desprovidos do esclarecimento sobre o assunto à que chegamos hoje, estariam lhe apoiando também.

Em que momento em Iracema José de Alencar apoiou a escravidão? Ou em que página no infelizmente inacabado O Sertanejo ele apoia a crueldade para com o outro? As pessoas de hoje são totalmente contra o preconceito e defendem esta bandeira com unhas e dentes, mas infelizmente por causa da cegueira causada pela ignorância, não percebem que assim o fazem com diferentes assuntos.

Tenho diversos exemplos de artistas, escritores, pensadores e professores dos quais antagonizo com suas pessoas, mas admiro e respeito o seu trabalho, o próprio José de Alencar é um destes exemplos, pois não concordo com esse posicionamento específico de sua vida pública, mas quanto à suas obras, não posso menosprezar absolutamente nada.

Isto me lembra de outro episódio recente onde o escritor Paulo Coelho se posicionava contra a deselegância cometida por nosso Presidente Jair Messias Bolsonaro com a esposa do Presidente Francês Emmanuel Macron e dentre os comentários de apoio ao presidente brasileiro encontro um monumental “escritorzinho lixo”.

Enquanto isso, o monumento que levantou esta questão está lá naquela praça muito mais pela obra de José de Alencar do que pela sua “luta” à favor da escravidão. Caso o objetivo fosse venerar esse sistema econômico arcaico e cruel (como pretendia argumentar o publicador do post), tenho certeza que outras opções seriam consideradas. 

Mas caso a intenção deste filósofo de Facebook fosse atacar monumentos polêmicos de nossas praças brasileiras, acredito que haveriam alternativas mais frugívoras, como por exemplo o monumento aos bandeirantes em São Paulo.

Ah, mas é claro eu esqueci da terceira e mais provável opção: o atual “mimimi”.

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