segunda-feira, 11 de novembro de 2019

Por Você



Por você

Alimenta, ensina, ama
Envelhece, entristece, cansa
Se completa, sorri, dança

Crítica e cobra
mas não sai do teu lado
Esteja certo ou errado
O amor personificado

E na incerteza,escondida chora
Mas por você
Abre um sorriso
E mostra a beleza daquela hora

E todos as noites ora,

Pede à Deus pra guardar o teu caminho
Para quando ela não estar por perto
Você não ficar sozinho

Não se acovarda,
Se engrandece para te defender
Te dar o sustento, te fazer viver

E mesmo depois de tudo isso
É ela quem fica grata
Se apequena, se rebaixa

Se resume à três letras

Todos os dias
Por você

quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Um grande "Fi%$0 d! Put%"


“A foto de um grande E$<#070. Do lado de casa tem essa praça. José de Alencar. Uma homenagem a um grande E$<#070. Escravista. E sua estátua me lembra todos os dias como não só apagamos a memória da escravidão, mas cultuamos o escravismo. 

Alguém publicou no Facebook estes dias... muitos comentários tão agressivos quanto o texto publicado corroboravam o autor do post, todos prometendo boicotar o autor à partir daquele instante. Muitos que talvez gostassem dos livros de Alencar, deixaram de apreciar sua obra à luz desta “nova” informação. Mas uma mente mais serena comentou “Nunca mais lerei seus textos da mesma forma”. Esta pessoa não postou que nunca mais lerá José de Alencar, só comenta que sua perspectiva sobre ele mudou. No frenesi do momento as pessoas acabam não percebendo que o seu comportamento é o mesmo daquele que diz “não leio as obras do Fulano porque ele é de direita ou esquerda”

Isso tudo levantou uma questão em minha cabeça: até que ponto o posicionamento político, sexual, social, etç do autor influencia na minha experiência com a obra publicada? Não deveríamos nós todos estar abertos ao diálogo e ouvir o posicionamento daqueles que pensam diferente de nós? Será que se o autor do post ao invés de criticar José de Alencar estivesse criticando a parada gay teria tantos comentários de apoio?

Claro que falar sobre escravidão não tem nada á se comparar com os tópicos acima levantados por minha vã filosofia, mas quando se critica alguém, principalmente do passado, devemos ter o cuidado para evitar anacronismos. Deve-se levar em questão o fato de que a escravidão, que hoje é vista como algo perturbador, desumano e cruel, naquela época era tida como algo normal e inclusive apoiada por setores tradicionais da sociedade como políticos, escritores e até alguns membros da igreja (vide a luta do frade Bartolomé de Las Casas no século XVI para reverter este quadro). Então, José de Alencar, em sua posição como político que era, visando o bem dos grupos à que defendia se posicionava desta maneira, e acredito que grande parte dos jovens revoltados daquele post de Facebook, se vivessem no século XIX e portanto desprovidos do esclarecimento sobre o assunto à que chegamos hoje, estariam lhe apoiando também.

Em que momento em Iracema José de Alencar apoiou a escravidão? Ou em que página no infelizmente inacabado O Sertanejo ele apoia a crueldade para com o outro? As pessoas de hoje são totalmente contra o preconceito e defendem esta bandeira com unhas e dentes, mas infelizmente por causa da cegueira causada pela ignorância, não percebem que assim o fazem com diferentes assuntos.

Tenho diversos exemplos de artistas, escritores, pensadores e professores dos quais antagonizo com suas pessoas, mas admiro e respeito o seu trabalho, o próprio José de Alencar é um destes exemplos, pois não concordo com esse posicionamento específico de sua vida pública, mas quanto à suas obras, não posso menosprezar absolutamente nada.

Isto me lembra de outro episódio recente onde o escritor Paulo Coelho se posicionava contra a deselegância cometida por nosso Presidente Jair Messias Bolsonaro com a esposa do Presidente Francês Emmanuel Macron e dentre os comentários de apoio ao presidente brasileiro encontro um monumental “escritorzinho lixo”.

Enquanto isso, o monumento que levantou esta questão está lá naquela praça muito mais pela obra de José de Alencar do que pela sua “luta” à favor da escravidão. Caso o objetivo fosse venerar esse sistema econômico arcaico e cruel (como pretendia argumentar o publicador do post), tenho certeza que outras opções seriam consideradas. 

Mas caso a intenção deste filósofo de Facebook fosse atacar monumentos polêmicos de nossas praças brasileiras, acredito que haveriam alternativas mais frugívoras, como por exemplo o monumento aos bandeirantes em São Paulo.

Ah, mas é claro eu esqueci da terceira e mais provável opção: o atual “mimimi”.

A Linguagem sob o Enfoque Histórico


A linguagem analisada do prisma sociológico apresenta duas teorias paradoxais: Ferdinand de Saussure prega que a língua possui um caráter social muito forte, unindo harmoniosamente os indivíduos que falam a mesma língua através de associações de consentimento coletivo existente entre eles à respeito dos signos utilizados na comunicação. “A língua seria uma espécie de consciência coletiva unificadora dos indivíduos de uma comunidade linguística” (p.02). Enquanto que o linguista soviético Mikhail Bakhtine interpreta a linguagem como uma ferramenta de uso comum aos indivíduos que se encontra em constante atualização, absorvendo neste processo todas as influências contextuais da sociedade em que é utilizada tais como classes sociais, momento histórico, regime político, religião, etnia, etc.
        Através desta discussão ocorrida entre as duas teorias, Maestri e Carboni nos convidam a discorrer sobre as realidades sociais que fizeram surgir os diferentes signos que compõe a linguagem. Quais as influências sofridas e como isso acarreta no seu entendimento histórico. Um bom exemplo é percebido quando ao citar Engels, os autores demonstram que a primeira forma de opressão surgida na terra foi a do homem sobre a mulher. E este fato fica registrado quando na construção da maioria das linguagens, o gênero feminino é dissolvido pelo masculino para abranger, sintetizar e até para neutralizar um signo linguístico, evidenciando assim a condição dominante do homem sobre a mulher nestas sociedades.“O homem faz sua história tendo consciência quando muito apenas parcial de como e porque a faz. No mesmo sentido, ele produz a linguagem com um grau de consciência muito limitado de sua construção e dos sentidos de seu conteúdo” (p.07).
          Os autores chamam a atenção para a importância deste conhecimento pois também nestas condições de superioridade versus inferioridade, foram escritas as histórias dos povos colonizados na América do sul. Para demonstrar isto são citados no texto, estudos morfológicos à cerca de signos utilizados na obra de Pero de Magalhães de Gândavo, considerada a primeira obra de cunho historiográfico no Brasil, História da Província de Santa Cruz datada dos anos de 1560. 
         Sabe-se que os europeus chegando à América desejavam colonizar as terras aqui existentes com o objetivo de arrecadar riquezas para eles e sua terra natal, em detrimento dos povos aqui já estabelecidos. Para tanto, uma forma de justificar estas ações seria destituir do indivíduo aqui residente, a sua condição humana. Para isso foram utilizadas muitas estratégias e uma delas foi a linguística, que apresentaria signos pejorativos e generalistas sobre estes habitantes tais como selvagens, feras e silvícolas que absolveriam diante da sociedade europeia e a igreja os atos de barbárie cometidos pelos colonizadores. Neste texto o autor evidencia este fato de uma forma que desperta no leitor o interesse sobre o assunto, apresentando nas diferentes nomenclaturas que os habitantes nativos da América tiveram ao decorrer da colonização, toda a semântica e o contexto histórico intrínseco na gênese do nome.
Mesmo para Platão “a escravidão de um indivíduo ou de um povo devia-se a incapacidade de autogovernar-se, por falta de discernimento intelectual, cultural e moral” (p.16). Os colonizadores europeus viram com seus olhos aquilo que queriam ver: um povo sem intelectualidade, sem cultura e sem moral, demonstrando em suas ações, pensamentos embasados pela filosofia grega. Através deste estudo fica evidente a conexão. “Ainda que o termo “cativo” sugira, com mais propriedade, uma condição nascida da violência social, prossegue sendo categoria alienada e alienante, ao não expressar a natureza profunda da relação de produção que enseja e justifica a própria dominação do homem pelo homem” (p.28). 
Outro grande expoente que sempre deve ser levado em consideração ao se estudar linguística é Lev Vygotsky (1896-1934) que além de trazer importantes contribuições para os estudos pedagógicos, demonstra como a linguagem interfere no desenvolvimento social do sujeito. Para Vygotsky a linguagem, além da comunicação, desempenha um papel muito mais considerável que a simples representação vogal dos sentimentos, pensamentos e considerações do indivíduo sobre o ambiente que o cerca. Em sua abordagem, a linguagem também serve para organizar os processos mentais em diferentes categorias, ordenando e orientando o processo de assimilação do conhecimento. Em suma, sintetiza o conhecimento adquirido atribuindo formas aos pensamentos decorrentes da experiência que o indivíduo está vivenciando, organizando o processo mental, possibilitando o desenvolvimento do pensamento para capacidades cognitivas mais complexas. Vygotsky apresenta a linguagem como evidência à sua argumentação em relação à natureza social do desenvolvimento humano. Podemos perceber estas evidências deste condicionamento do desenvolvimento humano ao convívio social em um episódio recente de uma criança que foi criada por lobos na região de Kalunga na Rússia e foi posteriormente encontrada apresentando quadros de distúrbios psicológicos, comportamento violento e sem capacidade de raciocínio ou interação (2007)[1].
Como apresentado por Vygotsky, a linguagem pode interferir inclusive em processos biológicos cerebrais e, portanto, se má utilizada, pode enraizar preconceitos ou até instituir a banalização de certos atos, assim como almejava Pero de Magalhães de Gândavo quando em sua obra destituía dos habitantes locais sua condição de humanidade para poder justificar a escravidão e outros atos de violência. Para tanto o estudo da linguística é de fundamental contribuição para aqueles que buscam nas raízes históricas o entendimento das causas para as condições sociais atuais e de suas transformações.


FONTES

MAESTRI, Mário; CARBONI, Florence. A Linguagem Escravizada: língua, história, poder e luta de classes (2003). Editora Expressão Popular. 96p.

LUIZ, Fernanda B.; LUCA, Gabriel G.; FONSECA, Fabiana B. Psicologia da Educação (2018). Editora Fael. 168p.





[1] http://port.pravda.ru/sociedade/curiosas/24-12-2007/20957-lobo-0/
 

quarta-feira, 31 de julho de 2019









Macuilxochitzin – Uma mulher na História

            Haja vista que em grande parte de nossa história as mulheres foram consideradas seres limitados e inferiores em comparação aos homens nas mais remotas civilizações existentes, quando estas conquistavam grandes feitos e galgavam uma posição social ou militar de prestígio, seus nomes eram crivados nos pergaminhos com o peso que a exceção à regra pré-dispõe na mente dos leitores já tão acostumados com nomenclaturas masculinas nestes postos. Porém aqui não se propõe discorrer de uma mulher que tenha vivido este roteiro estabelecido para o estrelato histórico, mas sim de uma que se fez conhecida com a simplicidade que, uma filha da realeza e mãe de um príncipe, nos consente projetar.
            O historiador Fernando Alvarado Tezozómoc (1525-1606) autor da Crónica mexicáyotl nos faz conhecer sobre a família desta notável mulher “Los otros doce hijos del viejo Tlacaélel Cihuacóatl, cada uno tuvo distinta madre, fueron engendrados en sitios diferentes. He aqui sus nombres ... Estos dos fueron mujeres, el séptimo la llamada Tollin­tzin, el octavo la llamada Macuilxochitzin. De ella nació el prlncipe Cuauhtlapaltzin"[1].
            O pai de Macuilxochitzin, se chamava Cihuacoatl Tlacaélel e era o conselheiro do rei asteca Axayácatl (reinou de 1469 a 1481), considerado bastante respeitado, tanto ao ponto de Tezozómoc se referir à ele em seus textos como “conquistador del mundo”[2].
Do alto de seu cargo hierárquico teve condições de proporcionar uma educação de qualidade à sua prole, incluindo Macuilxochitzin. Seguindo este raciocínio, dentre os estudos que ela teve acesso podemos citar o bordado, o tear, a astronomia, o calendário ritual, a retórica e também a arte de improvisar rimas e cantos que eram utilizados tanto nas guerras quanto em rituais sagrados.
As mulheres que se dedicavam à esta arte eram conhecidas como forjadoras de cantos, existindo inclusive representações destas no Códice Florentino. Macuilxochitzin era uma delas e apenas um de seus poemas perdurou até os nossos dias, este se encontra arquivado na coleção da Biblioteca Nacional do México. Neste canto, ela narra uma das batalhas ao qual participou tanto seu pai quanto o rei Axayácatl, um embate que foi relatado por diferentes historiadores ao longo dos séculos, porém, Macuilxochitzin, como filha do conselheiro real, teve acesso à detalhes da batalha que poderiam passar despercebidos à olhares famintos por grandes feitos.
Ela nos conta que o senhor dos astecas foi ferido nesta batalha por um capitão do exército inimigo chamado Tlílatl, e que quando este é levado diante do rei para receber o castigo pela desrespeitosa investida, este aparece fazendo reverências e lhe oferecendo uma pele de viado e uma torra de madeira como pedido de desculpas.
Estes itens talvez representassem as riquezas e tesouros do pobre povo Otomí que na ocasião estava sendo atacado pelo exército do rei Axayácatl. Porém, como percebemos nas últimas linhas do canto de Macuilxochitzin, a fúria do rei só é aplacada (pelo menos por hora) com a intervenção das mulheres de Tlílatl, que suplicavam ao rei por misericórdia.
É cativante perceber como a sensibilidade de uma mulher logo inclui em seu relato a participação das mulheres no desfecho da história, assim como nos chama atenção à pobreza dos conquistados. Isto nos faz questionar o quão vasto seria a riqueza de detalhes se demais relatos históricos contidos nos livros didáticos fossem concebidos por mulheres. Assim como a história dos dias atuais atesta a necessidade de se exercitar a alteridade e a inclusão de pontos de vista opostos para enriquecer a construção do conhecimento, é de suma importância perceber que a história foi concebida e escrita pelos homens, e a visão da mulher sobre estes períodos deve ser resgatada.
Até hoje a mulher é forçada à lutar pela sua posição na sociedade, um ponto de igualdade de direitos e de desconstrução do pensamento machista presente nas relações sociais de todos os países do mundo. Uma luta tão antiga quanto à que intentava pelo fim da escravidão, já que também são do contato com os ideais iluministas que surgem os primeiros escritos de caráter feminista, como por exemplo “Em Defesa dos Direitos das Mulheres por Mary Wollstonecraft (1759-1797).
Visto que até o final do século XIX  a história tinha como objetivo principal o estudo das grandes personalidades e dos grandes acontecimentos sociais e militares, obviamente que Macuilxochitzin acabou por ficar de fora, não somente ela mas muitos “homens comuns” também não tiveram sua história relatada, nem é argumentado aqui a necessidade de se estudar todos os seres humanos individualmente, porém ao se tratar das mulheres, praticamente se excluíam dos relatos um gênero inteiro.
Descartando as mulheres inseridas no cenário proposto no início do texto, sobram poucas informações sobre este gênero ao longo dos séculos. Assim como sobre Macuilxochitzin, da qual temos conhecimento ínfimo, ela acaba apenas por se enquadrar como mais uma mulher na história (ou fora dela). Macuilxochitzin, portanto, desempenha um papel de inestimável posição dentro da história, além de enriquecer a historiografia asteca, representa um grito por atenção e por inclusão de todo um gênero, um pedido de socorro ao qual o historiador contemporâneo não pode dar as costas.


Fontes:


[1] Tezozómoc, Fernando Alvarado, Crónica mexicáyotl, Instituto de Investigaciones Históricas, México, 1949, p .. 128.
[2] Temzómoc, Fernando Alvarado, op. cit .• p. 121.